ASSIM FOI O MEU 25 DE ABRIL DE 1974

Recordar e comemorar o 25 de Abril passados estes 50 anos é passar-nos pela memória meio século de luta do nosso povo em defesa das liberdades, das conquistas e dos ideais de Abril, que imediatamente foram postos em causa pela alternância dos governos PS e PSD, verdadeiros responsáveis pelos retrocessos sociais ao teimarem destruir Abril!

Quando se deu o 25 de Abril eu era um jovem estudante, que por influência do Vítor Matos e da nossa saudosa Néné, dei os primeiros passos na luta estudantil, envolvendo-me na Pró-Associação de Estudantes do Liceu Nacional do Barreiro e no associativismo, na Seção Cultural do Luso Futebol Clube e no Cine Clube do Barreiro.

Recordo-me tão bem daquela manhã libertadora do 25 de Abril que abriu a esperança dum país novo ao nosso povo. Era uma quinta-feira, dia de trabalho e de escola. Em casa todos se levantavam um pouco antes das 7h da manhã, meu pai ferroviário, trabalhava em Santa Apolónia e a minha irmã era administrativa também numa empresa em Lisboa e eu preparava-me para ir para a escola nos Casquilhos.

A rotina matinal foi quebrada por algo inesperado, eram umas 7,30h quando no Rádio Clube Português ouvimos a seguinte informação:

¨Conforme tem sido difundido, as Forças Armadas desencadearam na madrugada de hoje uma série de ações com vista à libertação do País do regime que há longo tempo o domina.
Nos seus comunicados as Forças Armadas têm apelado para a não intervenção das forças policiais com o objetivo de se evitar derramamento de sangue. Embora este desejo se mantenha firme, não se hesitará em responder, decidida e implacavelmente, a qualquer oposição que venha a manifestar-se. Consciente de que interpreta os verdadeiros sentimentos da Nação, o Movimento das Forças Armadas prosseguirá na sua ação libertadora e pede à população que se mantenha calma e que se recolha às suas residências. Viva Portugal! ¨.

Meu pai deu um grito, ¨caiu a ditadura…vou já para Lisboa! ¨ e a minha irmã seguiu-lhe os passos e lá foram e, certamente foram testemunhos de cenas históricas que mudariam o país, assistindo á ocupação do Terreiro do Paço por uma força da Escola Prática de Cavalaria de Santarém, comandada pelo Salgueiro Maia.

Hoje passados 50 anos tenho plena consciência da importância que teve essa saída em massa para as ruas de regozijo e solidariedade com as forças armadas, de onde nasceu a Aliança Povo-MFA.

Eu também não fiquei em casa, saí e corri para o Liceu, até porque pensei imediatamente que sendo da Direção da Pró-Associação era importante fazer alguma coisa. Os ânimos por lá andavam quentes, até porque havia pouco tempo tinha havido a luta contra os exames nacionais, contra a reforma do Veiga Simão, o ministro fascista para a Educação. Os exames tinham sumido da Secretaria do Liceu e os exames tiveram que ser adiados, uma pequena grande vitória dos estudantes no Barreiro.

Chegado aos Casquilhos já lá estavam alguns estudantes e professores, aos poucos o Liceu tal como noutros estabelecimentos de ensino no Barreiro iam-se enchendo de alunos e professores. No ar sentia-se um clima eufórico, não era um dia normal de aulas. Começou a dar-se forma organizada aos inúmeros estudantes e professores (que não quero citar nomes por puder esquecer algum e ferir suscetibilidades). O importante a referir era a intensidade dos momentos que vivíamos. A emoção incontida, o sentimento dos jovens na esperança do fim da guerra colonial que tantas vidas ceifou á nossa Juventude, a esperança na liberdade e democracia que poriam fim aos longos 48 anos de ditadura fascista.

Dali do átrio do Liceu, nos Casquilhos saímos organizados num desfile que se ia unindo a outros de outras escolas e de empresas, que se transformou numa manifestação que atravessou a ruas do Barreiro até ao Largo Casal, onde na varanda dos Penicheiros, figuras destacadas da Oposição  Democrática se dirigiram á multidão pela primeira vez em Liberdade, de que me lembro entre outros do Hélder Madeira e do Alfredo Matos, se a memória não me falha.

Era o Barreiro, Fortaleza de abril, a abrir as portas à Democracia. No dia seguinte, a 26 de abril realizou-se a primeira grande manifestação com mais de 10 mil populares nas ruas e no dia 27 o primeiro comício organizado no Parque do Barreiro. Também no dia 27 de abril inaugurava-se o primeiro centro trabalho do PCP, uma afirmação da importância dos partidos na construção da Democracia.

E foi assim o meu 25 de Abril de 1974 e ali estava eu com os meus 16 anos interiorizando todos aqueles acontecimentos. Estava a escrever-se uma nova História feita de Cravos e eu fazia parte dela. E cá estou até hoje a lutar e a defender Abril!

Jorge Ferreira de Amorim

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